(Padre Alexandrino Monteiro, S. J.)
Entre os hebreus usavam-se duas sortes de pesos e de balanças. Havia o chamado peso do Santuário, que era verdadeiro e justo; e o chamado peso público, que era falso e injusto.
Ora, com duas sortes de balanças se pesam também os pecados dos homens. Se se pesam na balança pública do mundo, que é mentirosa e falaz (Prov 11, 1), dir-se-á que o pecado mortal não é coisa de valor, e que o venial, como leve que é, não tem nenhuma importância. Mas esse modo de pensar já o lamentava Santo Antônio de Pádua em seu tempo (Dom. 4 post Trin.).
Os Santos, porém, e as almas iluminadas pela fé, pesam o pecado venial com a balança do Santuário, e por isso, o choravam e detestavam de morte. Santa Catarina de Gênova quase morria ao considerar a gravidade do pecado venial; e São Luís Gonzaga [em sua primeira confissão] caiu desfalecido aos pés do confessor, depois de confessar suas levíssimas culpas. São João Crisóstomo chegou a dizer que lhe parecia que se deviam evitar com mais cuidado os pecados veniais que os mortais. E dá a razão: os pecados mortais por sua natureza repelem [a alma justa]; porém, os veniais, por isso mesmo que são leves, não amedrontam, e se cometem facilmente.
Meditemos, pois, sobre o pecado venial, para nos enchermos de um grande temor de o cometer. Dividiremos a meditação em três pontos: I. O que é o pecado venial; II. Os danos que causa à alma; III. Como Deus o castiga. (...)
Ah! Meu Deus, meu divino Samaritano, eu, pelos meus pecados veniais, me encontro ferido e despojado dos bens sobrenaturais, e só me encontro com a vida da graça. Tende compaixão de mim, curai a minha alma de tantos pecados veniais. Curai-me com o óleo das Vossas divinas inspirações, e com o vinho do Vosso amor fortificai a minha vontade para me levantar, e começar a viver uma vida mais fervorosa.
I. O que é o pecado venial
Verdadeiramente sábio é aquele que julga das coisas como elas são. Ora, vejamos à luz da fé e da teologia o que é o pecado venial. São Tomás diz que o pecado mortal é uma desordem da alma, pela qual volta as costas a Deus, seu último fim, para aderir à criatura. Para adquirir algum bem temporal, perde o princípio da vida espiritual, que é a caridade do amor de Deus e a graça. Pelo pecado venial, a alma adere a algum bem mundano, mas não de modo que renuncie ao seu último fim, e sem perder o princípio vital da graça. Está enferma, mas não está morta.
1. Suposto isto, discorramos. É certo que o pecado venial não despreza a Deus como o mortal; todavia não faz de Deus a devida estima. Não se opõe de todo à Vontade divina, mas opõe-se-lhe ao menos no modo, como diz S. Tomás (1-2, q. 88, a. I). Desgosta a Deus, não observando perfeitamente os Seus mandamentos.
E se é assim, como se pode chamar leve? Quem tal dissesse proferiria uma blasfêmia, segundo afirma São Bernardo.
No pecado venial não se há de considerar tanto a leve transgressão do divino preceito, quanto a infinita majestade de Deus, que só se contenta com a perfeita observância dos Seus mandamentos. São Jerônimo, escrevendo a Celância, diz: 'Não sei se podemos chamar leve algum pecado que se comete com desprezo de Deus. E só é prudentíssimo aquele que não considera só o que se manda, mas quem manda; nem quão grande é a ordem, mas a dignidade do que ordena'.
2. Ajuntemos a isto que, se o homem falta ao divino preceito em uma coisa pequena, por isso mesmo comete uma falta indesculpável, porque poderia facilmente evitá-la.
Foi maior a culpa de Adão por não obedecer a Deus em coisa tão leve, como era privar-se de comer um fruto, ordem que tão facilmente podia cumprir. Naamam foi censurado também por não cumprir uma lei tão fácil, que lhe impôs o profeta para o curar da lepra, como era banhar-se sete vezes no Jordão. A culpa de Naamam está em que, sendo-lhe imposta condição tão fácil para o curar da lepra, a não quis aceitar por achá-la tão ligeira. Se lhe impusesse o profeta algum remédio violento, certamente que o tomaria. O mesmo motivo tira toda escusa a quem comete um pecado venial; pois, se para evitá-lo tivesse de suportar grande fadiga e vencer uma grande repugnância, poderia haver alguma desculpa se não o evitasse; mas para vencer-se numa coisa tão fácil, que desculpa pode haver?
3. Além disto, devemos considerar o pecado venial em duas relações importantes: em relação à pessoa ofendida, que é Deus; e em relação à pessoa ofensora, que é o pecador.
Com relação à majestade da pessoa ofendida: quem não sabe que, tratando-se de um alto personagem, ninguém tem por leve a menor falta de respeito? Com freqüência lemos nas histórias como grandes príncipes castigaram, com a pena de morte, as menores faltas de atenção e respeito dos seus vassalos. E será o pecado venial uma coisa tão ligeira, ofendendo e desgostando a infinita majestade de Deus? 'Nunca é leve desprezar a Deus numa coisa pequenina', diz São Bernardo. A Lei de Deus se há de guardar como a menina dos olhos, aos quais basta um argueiro para lhes causar uma grande dor.
Com relação à qualidade da pessoa ofendida, que é Deus sob o título de Pai, que filho haverá tão desleal e ingrato, que diga: 'A meu pai não quero tirar-lhe a vida, nem feri-lo mortalmente. Isso não; mas quero desgostá-lo de manhã até à noite, e magoá-lo nas mais pequenas coisas'. Que filho desnaturado seria este! Pois outro tanto faz o pecador com Deus, seu Pai, pagando-Lhe os benefícios com ingratidões, com desacatos, com indelicadezas. É semelhante aos judeus, que não só crucificaram a Cristo, mas O flagelaram, coroaram de espinhos, e insultaram com palavras sarcásticas e afrontosas. E parecerá a alguém coisa leve tanta impiedade?
Com relação ao ofensor, quanto aumenta a malícia do pecado venial o ser cometido por uma alma justa, que pela graça santificante é amiga de Deus, filha adotiva e esposa do Espírito Santo? Quem não sabe que os desgostos e ofensas que se recebem de um amigo, e muito mais de um filho ou de uma esposa, são sempre muito mais sensíveis, que as ofensas recebidas de um estranho ou de um inimigo?
O patriarca Jacó não acabava de se lamentar de que Ruben, seu primogênito, e a quem amava como a pupila dos seus olhos, tivesse cometido em sua própria casa um delito (Gn 49, 3). E o divino Salvador, na traição de Judas, parece sentir menos a entrega a Seus inimigos, que a ingratidão de um discípulo, de uma pessoa, por assim dizer, de Sua família, que por tantos títulos Lhe estava obrigada. Do que se lamentou por boca do profeta Davi: Se meu inimigo me atraiçoasse, eu o suportaria facilmente; mas, tu, meu discípulo e apóstolo?... (Sl 54, 13).
Aqui é o lugar de refletir, como sendo eu tão amado de Deus, de Quem estou recebendo continuamente tantos benefícios, ouso desgostá-lO com as minhas infidelidades, com as minhas culpas, ligeiras sim, mas que ferem profundamente o Seu amoroso Coração. A estas culpas e ingratidões chama o Senhor, pelo profeta Zacarias, feridas profundíssimas que recebe dos que Lhe são mais caros: ' -Que querem dizer estas feridas em meio de tuas mãos? -Delas fui traspassado na casa daqueles que me amavam' (Zac 13, 6).
Objeção: Apesar de tudo, o pecado venial não é culpa grave.
Resposta: Primeiramente, o pecado venial é culpa leve em comparação com o mortal, mas não assim considerado em si mesmo. Assim a Terra é um ponto em relação ao Céu, mas em si mesma é uma imensa massa que tem de circunferência vinte e duas mil léguas.
Em segundo lugar, o pecado venial, ainda que seja leve no gênero de culpa, não se pode dizer que o seja também no gênero de mal. E é tão grande mal que, para perdoá-lo, foram necessários os méritos de Cristo, como diz São Bernardo. O divino Redentor derramou todo o Seu Sangue não só para pagar os pecados mortais, mas também para satisfazer pelos veniais; e nas santas indulgências se aplica o tesouro dos méritos de Cristo para satisfazer à divina Justiça tanto pelos pecados mortais quanto pelos veniais.
E pode chamar-se pequeno mal aquele pelo qual a Sabedoria infinita de Deus julgou conveniente derramar o Seu Sangue de infinito valor?
O pecado venial é tão grande mal que não há, acima dele coisa pior, senão o pecado mortal.
Sob qualquer aspecto que se encare, o pecado venial é pior que o inferno, pois, como diz Suárez, sendo o inferno pura pena, poderia escolher-se [de preferência ao pecado]; mas o pecado venial, sendo mal de culpa, não se pode escolher em nenhum caso. [Seria preferível padecer o inferno a cometer um pecado venial.]
É tão grande mal o pecado venial, que não pode cometer-se nem por obter algum grande bem, nem por evitar um grande mal. Se alguém pudesse, com uma leve mentira, salvar todos os condenados do inferno, ou converter todos os infiéis, não deveria, por forma alguma, proferí-la.
Finalmente, supondo mesmo, o que não é verdade, que o pecado venial é coisa leve, tanto em razão da culpa quanto em razão do mal, convêm refletir no número incalculável destas culpas, que se cometem desde pela manhã até à noite. Donde disse Santo Agostinho: 'Se não temes estes pecados quando os pesas, teme-os quando os contas'.
Se o pecado mortal é como o raio que mata, os pecados veniais são como o granizo que fustiga a vinha da alma. Por isso disse Quintiliano: Se não ofendem como raio, prejudicam, ao menos, como saraiva.
Se o pecado mortal é um mar, que faz naufragar o navio, os pecados veniais são outras tantas gotas que, unidas, igualmente o podem afundar. E, no caso de naufragar, pouco importa, diz Santo Agostinho, que isto aconteça por uma furiosa tempestade, ou que a água entre por uma fenda, gota a gota.
Não queremos com isto dizer que muitos pecados veniais façam um mortal; mas que muitos pecados veniais dispõem para o mortal [e com disposição próxima.]
II. Danos do pecado venial
Muitos são os danos que o pecado venial acarreta à alma.
O primeiro é a mancha que lhe imprime, e a torna abominável aos olhos de Deus. O rei Nabucodonosor ordenou a seus ministros que lhe escolhessem para pajens jovens puros, sem defeito e sem mancha, porque doutra forma não seriam aceitos e gratos a seus olhos (Dn 1, 4). Assim também quis Deus que os justos fossem isentos da menor culpa, porque, de outra maneira, os olharia com desagrado e desdém.
Este é, também, o modo de proceder entre os homens. Um vestido só presta quando estiver isento de qualquer mancha, ainda que não esteja rasgado. Uma rainha, por mais rica e majestosa que seja, se tem no rosto um defeito, perde toda a sua graça e beleza, e deixa de ser admirada e estimada pelos homens. Ora, a alma rica de virtudes e de dons sobrenaturais, ainda que seja verdadeiramente rainha pela graça santificante, pelo pecado venial torna-se disforme aos olhos de Deus, que não mais se compraz nela, e a olha como objeto de repulsão.
Uma dama espanhola, dirigida espiritualmente pelo padre João d'Ávila, teve ardente desejo de ver o estado de sua alma, e pediu ardentemente a Deus que lho mostrasse. Apareceu-lhe um Anjo com uma menina cheia de chagas purulentas, que dava compaixão, e disse-lhe: 'Esta é a tua alma'. Ficou a serva de Deus aterrorizada com esta aparição, e correu a manifestar ao seu diretor espiritual o que tinha visto. 'E essa menina estava viva ou morta?', perguntou-lhe o padre. 'Viva', replicou a serva de Deus. 'Consolai-vos em parte, porque, se a menina estava viva, é sinal de que a vossa alma está na graça santificante', disse o venerável padre.
O segundo dano do pecado venial à alma, é privá-la das graças atuais que o Senhor lhe concederia, se fosse mais pura e isenta de culpas. Estas graças atuais são certas luzes mais vivas na mente para conhecer o bem, certas inspirações mais eficazes para mover o coração e a vontade, certa compunção e doçura espiritual na oração, maior coragem para resistir às tentações, e outras semelhantes.
Assim como um pai, desgostado pelas muitas desobediências de um filho, não lhe faz certas finezas, que lhe faria se fosse mais obediente: assim Deus, indignado pela ingratidão do homem que se contenta só com não ofende-lO mortalmente, o priva de muitas graças especiais, que lhe concederia se o visse mais fervoroso em Seu serviço.
Quantos se desgostam e maravilham porque não encontram gosto na oração; porque, pedindo de contínuo a Deus e aos Santos, não são ouvidos; porque se encontram sempre tão fracos e débeis na tentação! E como podem pretender que Deus os favoreça com graças especiais, se eles se tornam indignos delas, pelos freqüêntes pecados veniais, com que se tornam desagradáveis aos divinos olhos? Como podem resistir aos assaltos das tentações se, pelos pecados veniais, se vêem abandonados dos auxílios celestes?
O terceiro e maior dano que o pecado venial causa à alma, é dispô-la para o pecado mortal. Isto sucede de dois modos, como ensina São Tomás: ou indiretamente, porque, retirando-lhe Deus os mais poderosos auxílios de Sua graça, naturalmente enfraquece e cai no pecado mortal; ou diretamente, porque, acostumando-se a cometer muitas vezes culpas leves, pouco a pouco chega, pelo mau hábito, a cair em culpas graves.
E além disto, acrescenta São Tomás que o pecado venial difere do mortal como uma coisa, imperfeita no seu gênero, difere de outra, perfeita; e como um menino, de um adulto (1-2, q. 88, art. 6, ad 1). Assim como fugimos de ter ao nosso lado um leãozinho, com receio de que se assanhe e nos mate, assim devemos ter longe de nós toda culpa venial, com receio que, de pequena, se torne uma grande fera, e nos estrangule e mate. Assim foi que a curiosidade de Eva degenerou numa grave desobediência; o afeto de Judas ao dinheiro, em deicídio; a política de Pilatos, na condenação de Jesus; e a imprudência de Salomão em casar-se com pagãs, em idolatria.
Por isso, o profeta Isaías se lamenta de que os pecadores preparem, com os seus pecados veniais, a corda com que hão de ser arrastados ao inferno (Is 5, 18). As cordas, retorcendo em si muitos fios, formam os grandes cabos, que suportam grandes pesos e seguram os navios. Assim os pecadores, comenta Santo Agostinho, multiplicando os pecados veniais, se dispõem para os mortais, que os arrastam à perdição.
Entremos dentro de nós mesmos e examinemos os muitos defeitos a que a nossa alma está habituada, para não nos acontecer o que a muitos têm acontecido. Santa Teresa escreve, em sua Vida, que foi levada ao inferno, e lá viu o lugar que haveria de ocupar, se não se emendasse de certos pecados veniais em sua juventude. O piloto, quando vê ao longe uma nuvenzinha no céu azul, prevendo a tempestade, colhe as velas e refugia-se em lugar seguro. Quando o céu da nossa alma se escurecer com alguma nuvem de pecado venial, tomemos precaução, porque pode vir a tempestade da tentação e levar-nos a cair no pecado mortal.
Sigamos o conselho dos mestres espirituais, que nos avisam que de pequenos princípios nascem tremendas conseqüências, e que o demônio procura levar gradualmente as almas das pequenas faltas às grandes, como diz São Doroteo (Serm. 3).
III. Castigos do pecado venial
A pena, como uma sombra, segue a culpa; e, assim como da grandeza da sombra se deduz a grandeza do corpo, assim da gravidade dos castigos com que Deus pune o pecado venial, se pode claramente deduzir a gravidade de sua malícia. Tanto mais que, sendo Deus a infinita justiça, castiga com toda a proporção; sendo a infinita sabedoria, sabe até onde deve ir a proporção do castigo; e, sendo incapaz de paixão humana, não pode castigar mais do que deve, nem por arrebatamento da cólera, nem por falsa apreesão, nem por desordenado sentimento.
Posto isto, vejamos como Deus castigou o pecado venial, nesta vida, tanto no Antigo quanto no Novo Testamento.
No Antigo Testamento, Moisés, tão favorecido de Deus, caminhando para o Egito a fim de libertar o povo de Israel, saiu-lhe ao encontro um Anjo para o matar (Ex 4, 24). E por qual pecado se viu Moisés nesse perigo? Porque tinha adiado circuncidar seu filho - não porque não o quisesse circuncidar, mas diferia fazê-lo por um terno afeto, que não passava de pecado venial. Mas Séfora, sua consorte, logo circuncidou o menino e com isto se aplacou a ira do Anjo.
Enviou Deus um profeta a Betel, ao rei Geroboão, com ordem de não comer pão pelo caminho, nem beber água (3 Rs 13). Fê-lo assim o profeta, mas, na volta, encontrou-se com outro profeta venerável, que o enganou, dizendo-lhe que entrasse em sua casa, que esta era a Vontade de Deus, e se fortificasse. Assim o fez o crédulo profeta, e comeu pão e bebeu água. Este pecado do profeta foi, certamente, venial. Não obstante, Deus fez sair de uma floresta um leão, que o matou. E para que se entendesse que isto acontecera, não por fome do leão, mas por culpa do profeta, não só o leão não devorou o corpo morto, mas guardou-o até ser sepultado.
Pela curiosidade de ver o incêndio de Sodoma, a mulher de Lot foi convertida em estátua de sal.
Por uma vã complacência que teve Davi em olhar para o seu fortíssimo exército, foi castigado com uma peste, que em três dias matou setenta mil pessoas.
No Novo Testamento, lemos nos fastos da Igreja gravíssimas penas com que Deus tem castigado o pecado venial. São Jerônimo narra de Santo Hilário que, por uma distração não repelida, permitiu Deus que o demônio saltasse sobre ele e o flagelasse.
Santo Odão, abade, escreve de São Gerardo Conte, que ficou cego por ter olhado fixamente para o rosto de uma menina.
Conta Paládio de um santo homem, que vivia em grande austeridade, ao qual Deus por muitos anos mandava, por um anjo, um alvíssimo pão, que lhe bastava para dois dias. Depois de algum tempo começou a pensar, por vaidade, que era melhor do que os outros. Logo Deus o castigou mandando-lhe, em vez de pão branco, pão negro.
Um dia Santa Francisca Romana sentiu que lhe davam uma valente bofetada. Voltou-se para ver quem a tinha ferido, e viu um Anjo que lhe disse: 'Esta bofetada te dei, em castigo do ócio com que estavas perdendo o tempo, que é tão precioso'.
Mas os maiores castigos do pecado venial são na outra vida.
Primeiramente, é sentença de São Tomás, de São Boaventura e do comum dos teólogos que, se um pecador morre sem a graça de Deus, e leva pra o inferno, juntamente com um pecado mortal, um pecado venial não perdoado, deverá sofrer lá uma dupla pena eterna, por um e por outro. E a razão é clara: porque no inferno não há redenção, e não lhe sendo perdoada a culpa venial, também não lhe será remitida a pena que lhe é devida.
Em segundo lugar, os pecados veniais, pelos quais não fizemos penitência, serão castigados no Purgatório com penas atrocíssimas. Se alguém neste mundo, por uma mentira ligeira, devesse ser lançado numa fogueira ardente, que horror não nos causaria! Mas o seu tormento seria breve, pois logo morreria. Mas as almas do Purgatório sofrem e não morrem; e sofrem não por um momento, mas por muitos anos, e até milhares de anos. E não é qualquer fogo o do Purgatório. Santo Agostinho diz que 'com o mesmo fogo é atormentado o condenado e purificado o eleito'.
Não é, pois, o pecado venial, coisa tão ligeira e insignificante, que não temamos cometê-lo.
São Maurício bispo, por se descuidar em batizar um menino, que logo morreu, renunciou ao bispado e se condenou a viver sempre peregrinando.
Santo Eusébio, por uma distração voluntária na oração, condenou-se a ter sempre os olhos baixos e a não olhar para objeto terreno.
O sacerdote Evágrio, em penitência por uma pequena distração, passou quarenta dias sem se sentar.
De São Paulo Eremita, escreve São Jerônimo em seu epitáfio, que chorava os pecados leves como se fossem gravíssimos crimes.
E quem terá tão pouco juízo que, podendo neste mundo resgatar a pena devida por seus pecados veniais com menores castigos, deixe para o fogo do Purgatório satisfazer por eles?
(Padre Alexandrino Monteiro, S. J., Os Exercícios Espirituais de Santo Inácio de Loyola, II Edição, Editora Vozes, Petrópolis: 1959, páginas 116-128)
Fonte: Texto retirado do antigo blog odioaheresia
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