terça-feira, 17 de junho de 2014

Ou Penitência ou... Purgatório


(PADRE ALEXANDRINO MONTEIRO, S. J. )


I. Acerbidade das penas do Purgatório

Ouvindo Santo Agostinho alguns de seu tempo dizer que, se escapassem do inferno, do Purgatório não tinham tanto medo, encheu-se de zelo e lhes fez ver o grande erro em que estavam, pois as penas do Purgatório superam tudo o que há de mais penoso neste mundo.

E com razão, porque o fogo que atormenta as almas do Purgatório é o mesmo que o fogo que atormenta os condenados no inferno, somente com exceção da eternidade. E assim é que a Santa Igreja não duvida chamar às penas do Purgatório penas infernais [na Liturgia dos defuntos].

O fogo do Purgatório é aceso por um sopro infernal, e é tão ativo que não se chama simplesmente fogo, mas espírito de fogo (Is 4, 4), e derreteria num instante um monte de bronze, mais facilmente que uma de nossas fornalhas devoraria uma palha seca. 
Rohrbach, Autel des « Pauvres Âmes » du purgatoire, XVIIIe siècle.

segunda-feira, 16 de junho de 2014

"Novo Pentecostes"


"NOVO PENTECOSTES"
Gustavo Corção
  
É a última espetacular novidade religiosa que se espalha com grande sucesso no mundo inteiro. Num recorte recente de "Le Monde" lemos a notícia desse movimento cujo sucesso se contrapõe, na pena de Henri Fesquet, "ao declínio das grandes Igrejas" mais ou menos institucionalizadas. Esse movimento de origem protestante, nascido antes do século, cresceu agora rapidamente. O número de "Assembléias de Deus" que era de 264 em 1963 ultrapassa o número de 400 em 1972. Calcula-se em dez milhões o número de praticantes no mundo inteiro", diz "Le Monde"; e como era de esperar anuncia que o movimento já entusiasmou o mundo católico onde ganha o nome de "renovação carismática" e até reclama o mais ousado título de "novo pentecostes".
   
Em Junho reuniu-se na Universidade Notre Dame, nos Estados Unidos, um "congresso de renovação carismática" com o comparecimento de 25.000 participantes entre os quais figuravam muitos padres, Bispos, e o Cardeal Suhenens, Primaz da Bélgica.
   
Que dizem de si mesmos esses católicos empenhados em tal movimento? Várias publicações, entre as quais destaco a do jovem casal americano Kevin e Dorothy Ranaghan, num livro traduzido em francês com o título "Le Retour de l'Esprit", apresentam o movimento pura e simplesmente como uma descontinuidade explosiva surgida na História do Cristianismo e produzida, nem mais nem menos, por uma nova descida do Espírito Santo sobre os milhares de adeptos que recebem, por imposição das mãos de outros, o "batismo do Espírito" e subitamente se convertem, mudam de vida, passam da mais profunda depressão à mais jubilosa exaltação, e começam a "falar em línguas", como os cristãos da Igreja nascente, e como os apóstolos no dia de Pentecostes (At 2, 1)

domingo, 15 de junho de 2014

O leigos tem o direito e o dever de se protegerem de Prelados que se desviaram da fé


O exemplo de S. João Gualberto

        Porém, é um Santo da Igreja Católica que nos indica o exemplo a seguir quando os Fiéis são confrontados com um Prelado rebelde que traz males à Igreja5. 

        S. João Gualberto viveu no século XII. Não é apenas um Santo; é também o fundador dos Beneditinos Valambrosianos. A sua festa celebra-se a 12 de Julho no calendário antigo. A heroicidade da virtude cristã de S. João Gualberto fica demonstrada por ele ter perdoado o assassino de seu irmão: encontrando-o um dia sem armas e sem defesa num beco sem saída, S. João Gualberto (que ainda nem sequer era monge) sentiu-se movido ao perdão quando o outro, erguendo para ele os braços em forma de cruz, lhe pediu misericórdia por amor de Cristo crucificado. E S. João perdoou àquele homem, apesar de ter andado em sua busca com um bando de soldados, a fim de executar vingança. Era Sexta-Feira Santa - foi então que S. João Gualberto viu uma imagem de Cristo crucificado que, tomando vida, lhe fazia com a cabeça um sinal de assentimento. Nosso Senhor transmitiu nesse momento a S. João uma extraordinária Graça especial que o levou a perdoar ao assassino de seu irmão. Foi também esse momento de Graça que o levou a tornar-se monge. 

        Como vemos, S. João Gualberto é o exemplo acabado do perdão de Cristo: quem pode perdoar o assassino do seu irmão pode perdoar qualquer ofensa. Ele foi ainda um homem de considerável importância na Hierarquia da Igreja, tendo conseguido fundar um Mosteiro e uma Ordem de monges que ainda existe nos nossos dias. A Ordem tinha - e ainda tem - a seu cargo uma igreja em Roma, a Igreja de Santa Praxedes, onde foi descoberta nada mais nada menos do que a coluna a que ataram Cristo para ser açoitado. É nesta igreja, mesmo ao virar a esquina da Igreja de Santa Maria Maior, que se encontra uma pintura do Santo perdoando ao assassino de seu irmão - evento claramente muito importante na História da Igreja. 

Deveres dos cristãos em defesa da fé



“A fé é o fundamento primeiro da unidade e existência mesma da Igreja, de maneira que, quando a fé está em perigo, todos os cristãos têm o grave dever de sair em sua defesa. Sendo esse um dever positivo, isto é, que não proíbe mas manda fazer algo, obriga segundo a condição das pessoas e a oportunidade. Como o Papa e os bispos diocesanos têm de Cristo o carisma da verdade para definir o dogma revelado, são eles os primeiros obrigados a defender a fé, discernindo com sua autoridade qual é a verdade católica em face das ameaças do erro. Mas os simples fiéis não são isentos de obrigação, porque, embora não lhes compita definir a doutrina, não lhes basta crer retamente em seu íntimo, senão que, para glória de Deus e utilidade do próximo, também são obrigados à profissão exterior e pública da fé: “Quando a fé está em perigo”, diz Santo Tomás, “todos são obrigados a propalar sua fé aos demais, quer para a instrução dos outros fiéis, quer para confirmá-los nela ou para reprimir o ultraje dos infiéis”. (Suma Teológica II-II, q. 3, a.2, ad 2).

Pois bem, ainda que o modo e o grau de obrigação da Hierarquia e dos simples fiéis sejam diversos, como porém a fé é um bem comum fundamental na Igreja, em ordem à defesa da fé há certa igualdade entre todos os cristãos. Portanto, se a Hierarquia mostra defecção em sua obrigação, os súditos têm o dever e o direito de argüir e repreender seus pastores como que de igual para igual, privadamente se o escândalo for oculto, publicamente se for público: “Quando ‘se resiste de frente e à vista de todos’ (São Paulo aos Gálatas, II, 11-14), ultrapassam-se os limites da correção fraterna; e por isso São Paulo não teria repreendido daquele modo São Pedro se não fosse de algum modo seu igual quanto à defesa da fé. Mas admoestar secreta e reverentemente também o pode fazer aquele que não é igual a outro, razão por que o Apóstolo escreve com respeito aos súditos que admoestem seu prelado, quando diz: “Dizei ao Bispo Arquipo: cumpre teu ministério” (Col., IV, 17). Deve-se saber, não obstante, que onde houver perigo para a fé os prelados podem ser repreendidos mesmo publicamente pelos súditos. Razão por que São Paulo, que era inferior a São Pedro, por causa de um iminente perigo de escândalo com relação à fé, repreende-o publicamente” (Santo Tomás, Suma Teológica, II-II, q. 33, a.4, ad 2.


Será que pela atual e moderna defecção da Hierarquia é que se lê em Ap, 18, 23a: “Não brilhará mais em ti a luz de lâmpada, não se ouvirá mais em ti a voz do esposo e da esposa”?
Negritos e Itálicos nossos. 

Fonte: Texto retirado do livro "A Candeia Debaixo do Alqueire", Padre Álvaro Calderón, p.132-133, Edições Mosteiro da Santa Cruz, Angelicvm - Instituto Brasileiro de Filosofia e de Estudos Tomistas.
Credit of the photo: --By Saints.SQPN.com

sábado, 14 de junho de 2014

Onde não há ódio à heresia, não há santidade.



Se odiássemos o pecado como deveríamos odiá-lo; puramente, profundamente, valentemente, deveríamos fazer mais penitência, infligir em nós próprios maiores castigos, deveríamos chorar os nossos pecados mais abundantemente. Pois, então, a suprema deslealdade para com Deus é a heresia. É o pecado dos pecados, a mais repugnante das coisas que Deus desdenha neste mundo enfermo. No entanto, quão pouco entendemos da sua enorme odiosidade! É a poluição da verdade de Deus, o que é a pior de todas as impurezas.

Porém, quão pouca importância damos à heresia! Fitamo-la e permanecemos calmos. Tocâmo-la e não trememos. Misturamo-nos com ela e não temos medo. Vêmo-la tocar nas coisas sagradas e não temos nenhum sentido do sacrilégio. Inalamos o seu odor e não mostramos qualquer sinal de abominação ou de nojo. De entre nós, alguns simpatizam com ela e alguns até atenuam a sua culpa. Não amamos a Deus o suficiente para nos enraivecermos por causa da Sua glória. Não amamos os homens o suficiente para sermos caridosamente verdadeiros por causa das suas almas.

Tendo perdido o tacto, o paladar, a visão e todos os sentidos das coisas celestiais, somos capazes de morar no meio desta praga odiosa, impertubavelmente tranquilos, reconciliados com a sua repulsividade, e não sem proferirmos declarações em que nos gabamos de uma admiração liberal, talvez até com uma demonstração solícita de simpatia tolerante [para com os seus promotores].

Do ódio santo de si mesmo



"Se se considera bem o que se há dito, bastará para engendrar em nós aquele ódio e aborrecimento santo de nós mesmos, que Cristo Nosso Redentor nos encomenda tanto no Sagrado Evangelho, que, sem ele, diz (Jo 14, 26), não podemos ser discípulos Seus. Por que, que mais é mister para isso, que saber que este nosso corpo é o maior opositor e inimigo que temos? Inimigo mortal, o maior traidor que jamais se viu, que anda buscando a morte, e morte eterna, a quem lhe dá de comer e tudo de que necessita; que por ter ele um pouco de prazer, não tem em nada ultrajar a Deus e jogar alma e corpo no inferno, para sempre.

Se dissessem a alguém: 'Sabei que um de vossa casa e dos que comem e bebem convosco, vos arma uma traição para matar-vos', que temor teria? E, se lhe dissessem: 'Pois sabei mais, que é tanto o ódio e inimizade que tem convosco, que tragada tem a morte em troca de matar-vos; já sabe que logo lhe hão de colher e matar a ele, e, com tudo isso, traz arriscada a vida para conseguir o que quer', como [o que fosse assim avisado] estando a comer e indo a dormir e a todas as horas, temeria e estaria sobressaltado, se havia de vir então [seu inimigo] e dar-lhe um golpe que o matasse! E, se pudesse descobrir quem é, que ódio lhe conceberia e que vingança faria contra ele! Pois esse nosso corpo, que come e dorme conosco, e sabe muito bem que fazendo mal a nossa alma, o faz também a si mesmo, e que jogando a alma no inferno, há de ir-se para lá com ela, com tudo isso, em troca de sair com seu gosto, atropela tudo e não repara em nada. Vede se temos razões de aborrecê-lo! Quantas vezes vos há posto no inferno esse vosso inimigo? Quantas vezes vos há feito ofender aquela Infinita Bondade? De quantos bens espirituais vos há privado? Quantas vezes põe vossa salvação em perigo a cada hora? Pois quem não se indignará e tomará uma coragem santa contra quem tantos males lhe há feito e de tantos bens lhe há privado e em tantos perigos lhe põe a cada momento? Se detestamos ao demônio e lhe temos por capital inimigo pela guerra e dano que que nos faz, maior inimigo é nossa carne, porque ela nos faz mais cruel e mais contínua guerra, e muito pouco poderiam os demônios, se não tivessem por eles esta carne e sensualidade para fazer-nos guerra com ela.